por Luciano Faraco
Em recente viagem aos USA, fui me deparando com uma sequência de acontecimentos triviais, mas que me fizeram refletir em como faz uma enorme diferença aqueles que fazem com que a nossa experiência de consumo seja diferente no sentido positivo. Nesses casos, me refiro à experiência de consumo de “serviços” em especial.
Tenho viajado para Los Angeles com certa frequência nos últimos anos e muitas vezes pela United – não sei bem a razão, mas creio ser pelos preços competitivos, além de ser uma companhia americana bem resolvida, com aviões novos, atendimento eficiente na cabine, segurança na bagagem, etc. Nessa última vez, como sempre, deixei para tentar um upgrade de assento de última hora. Fui na loja da United e, apesar de muito bem atendido, eram poucas as opções e as que tinham estavam muito caras. Desisti e fui ao check-in. Na minha vez, fiz uma última tentativa e, para minha surpresa, o atendente me deu um upgrade sem custo. Muito provavelmente porque com embarque próximo não teria vendido. Ponto para United.
As boas experiências continuaram: na locação do carro, no café da manhã, no atendimento de uma compra muito específica em uma loja – mesmo com vários clientes esperando, o vendedor foi espetacular! – no upgrade de um quarto de hotel, nas informações dentro de um parque, etc, etc. Será coincidência?
Vindo direto do Brasil e sem querer fazer apologias a outro País (mas já fazendo), fica fácil constatar que a forma com que os americanos, em geral, lidam com seus consumidores é, de longe, mais consistente e eficiente que a nossa.
Os americanos são obcecados pela qualidade e usam uma expressão que, particularmente, gosto muito: “How to exceed your expectations”. Na verdade, as melhores empresas americanas têm como objetivo atuar no que chamam de “delta superior”. Ou seja, não se satisfazem em ficar na média, basicamente por duas razões: a média te puxa para baixo ao longo do tempo e, portanto sendo muito perigoso, e a segunda razão se dá pelo simples fato de atuarem em um ambiente de extrema competição e concorrência, onde somente os melhores mesmo sobrevivem. E com isso ganham a gente, os consumidores.
Ao atuar sempre no delta, as empresas fazem com que a “régua” da exigência seja sempre alta e isso faz toda diferença. Você realmente acha que o atendente da United que me deu o upgrade foi com a minha cara ou será que tinha um processo por trás? Alguma referência dos meus gastos no computador dele na hora que estava falando comigo? Ou a atendente do Denny’s que, exatamente após chegar meu café da manhã, passou pela minha mesa perguntando se os ovos estavam como pedi? Não se iluda, são profissionais muito bem treinados e com processos de qualidade muito bem pensados.
O CSI (Consumer Satisfaction Índex) americano é muito levado a sério. Todos os anos a disputa é acirrada e respeitada, gerando muito mais receita aos tops da lista.
Creio que no Brasil muito já se avançou se compararmos com alguns poucos anos atrás. O advento das redes sociais e as crises forçam as empresas a se superarem a cada ano. No entanto, eis o mais importante: entendo que estamos ainda muito distantes, que é uma mudança real em nossa essência na prestação dos serviços com qualidade em todo processo. Nos EUA já é algo planejado, enraizado nas empresas, com sua cultura interna voltada para “exceder as expectativas”. Mas no fundo, não é algo que estamos acostumados e muito menos “aculturados”.
No mercado imobiliário, em especial no trabalho de intermediação, típico exemplo de prestação de serviços com todas as letras, deixamos muito a desejar. Nos últimos anos ficou ainda pior, com o advento das grandes imobiliárias, o nível da qualidade caiu ainda mais e por diversas razões como: a massificação dos corretores, o pensamento do curto prazo, a falta total de fidelidade do cliente, a falta de visão e investimento em uma carreira na corretagem, a necessidade desesperadora dos ganhos financeiros, que deixa o processo totalmente pressionado…
É o que chamo de “muleta”dos incorporadores, que ao proporcionar total apoio ao corretor, na maioria das vezes acaba por transformá-lo em um mero assistente do processo, etc, etc…
Por outro lado, o trabalho de corretagem tem um espaço enorme para ser um exemplo de boa qualidade na indústria de serviços. Justamente pela sua imensa falta, tem-se ai uma grande oportunidade. Veja como é o “broker” americano – e lá vou eu fazendo apologias: é uma entidade à parte, é respeitado social e profissionalmente, faz de sua profissão uma carreira, estuda, faz cursos e exames dentro da industria imobiliária.
Será que se tratando de uma das decisões de compra, considerada a mais importante de uma vida, justamente esse profissional e essa empresa imobiliária não deveriam ser protagonistas na qualidade do atendimento e de todo processo de compra? Pois é exatamente o contrário: arrisco dizer que é uma das piores, senão a pior na média geral. No entanto, há exceções e há esperança, pois tanto incorporadoras como imobiliárias (poucas) começam a enxergar um movimento ou uma oportunidade no horizonte, uma volta ao passado. Digamos que é um modelo “retrô” de business, porém com muita tecnologia de ponta. Ou seja, customização com digitalização. Será esse o caminho?
Acho que é uma ótima guinada, mas me parece que mais fundamental ainda é se a guinada fosse na indústria como um todo, pois só dessa forma, e muito lentamente, conseguiríamos mudar nosso “padrão”. Isso sim é o mais difícil e que faria de fato que eu, você e toda nossa sociedade não aceitássemos mais o trabalho na média. Porque média para os americanos é igual à mediocridade – e isso para eles é inaceitável.
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